Coleção Clássicos da Literatura Juvenil

Apresentação e resenha dos livros da coleção editada pela Abril Cultural entre 1971 e 1973.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Volume 5 - Dom Quixote - Miguel de Cervantes



A obra cervantina que a coleção Clássicos da Literatura Juvenil apresenta em seu quinto volume é reconhecida na tradição literária ocidental como o maior romance de todos os tempos -- ou assim a consideraram em 2002, quando uma votação foi feita pelos maiores escritores contemporâneos nossos.
Dom Quixote é o nome resumido da obra que no início do século XVII foi publicada em dois volumes, sob o título O engenhoso fidalgo Dom Quixote de la Mancha, e narra as aventuras e desventuras de um bondoso espanhol que já aos cinquenta anos, com a cabeça fervilhando de histórias, aventuras, feiticeiros, dragões, donzelas, castelos e cavaleiros à la Amadis de Gaula, autonomeia-se cavaleiro, encontra na figura da camponesa Aldonça Lourenço a "formosa donzela" Dulcinéia de Toboso, razão de seu viver, e parte em busca da própria sorte. Para isso, toma de seu celeiro o raquítico e velho cavalo, ao qual nomeia Rocinante, e convence um vizinho mais realista, de nome Sancho Pança, a ser seu escudeiro.
O que se segue, nesta obra adaptada pelo imortal da literatura brasileira Orígines Lessa, é uma série de desastres e de disparates cometidos por Dom Quixote, que toma por gigantes os moinhos de vento, e toma hospedarias de beira de estrada por castelos, lavadeiras por damas, e chega até mesmo a libertar condenados de el-rei e a "enfrentar" um leão. Nesse clima de comédia do riso e do grotesco, figuram principalmente a nobreza e a pureza de coração do protagonista e a picardia de Sancho, que, adotando um ponto de vista mais realista, provê condições de sobrevivência a ambos porque não só é necessário que o faça, mas lhe garante que o amo fique vivo para que tenha chance de lhe entregar a tão prometida ilha, em que seria governador.
Na verdade, há muito mais em Dom Quixote do que a simples comédia e o grotesco. De início, Cervantes de fato quis destacar as novelas de cavalaria, que então já estavam em declínio, e ridicularizar a fé, a política, o ideal e o nobre em prol da liberdade do indivíduo. Assim acontece no primeiro volume. No entanto, a segunda parte da narrativa exalta a figura do herói, a verdade, a nobreza, a ingenuidade, a bondade versus as coisas ruins que lhe sucedem, como por exemplo todas as situações ridículas a que ele e Pança são submetidos pelos nobres para que façam papel de palhaços (ou, numa interpretação mais próxima da época em que o livro foi publicado, como bobos da côrte), ao mesmo tempo em que seus feitos alcançam fama nacional a ponto de render, dentro da própria narrativa, um livro em sua homenagem, destacando -- e ridicularizando -- suas ações e a de seu fiel escudeiro. O equilíbrio barroco dos lados opostos também está presente nas ilustrações de Walter Hune (um dos grandes ilustradores da Editora Abril à época do lançamento desta coleção), que balanceia na ponta de seu carvão os traços das personagens e as sombras das cenas retratadas.
Nesta narrativa recontada por Lessa, muito das descrições foi resumido e as ações ocorrem muito próximas umas das outras, e embora isso descaracterize, de certo modo, a obra original, não evita que o leitor perceba a diferença que comentei há pouco sobre como Quixote é tratado em ambos os volumes publicados respectivamente em 1604 e 1615 -- mesmo que este volume não traga a divisão entre Tomo I e Tomo II --, e certamente ganha no efeito de riso porque as aventuras se sucedem rapidamente e o acúmulo de situações ridículas seja mais intenso. Ao mesmo tempo, não impede que o leitor se apiede da figura de Quixote e até mesmo de Pança, por todas as surras que tomam e toda a ingenuidade que, apesar de tudo, ambos cultivam.
Ainda que não seja do meu feitio revelar finais de histórias, esta já é uma por demais conhecida e representada pelas outras artes para que eu me furte de comentar um ponto interessante relacionado ao final do livro. Bastante realista é o desfecho desta narrativa, em que o cavaleiro, já velho, cansado, sofrido e doente, volta a si e reconhece ser Alonso Quixano, o Bom, como era conhecido por seus vizinhos. Ao mesmo tempo, rejeita as novelas de cavalaria, revela-se um crente chamado por Deus e, por isso, trata de se despedir de seus queridos e de compor seu testamento, no qual se lembra de sua ama, de sua sobrinha e de Sancho Pança, e finalmente morre.
Mesmo que em toda a narrativa o leitor tenha convivido com toda situação de ridículo e de grotesco, em nenhum momento Cervantes deixou de destacar ou de exaltar o cristianismo -- no início, para ridicularizar as batalhas cristãs em nome da política, já que eram em nome de um rei, e finalmente para caracterizar a personagem como o aldeão "remediado", dono de terra e crente na fé católica que regia (e rege) a Espanha. Cervantes revela um Quixote que morre em paz com Deus e com os seus, mas que até hoje, após tantas discussões sobre o valor literário da obra, em tantos contextos diferentes, continua a cavalgar, digno, bom e corajoso, na imaginação e nos corações daqueles que sabem que um cavaleiro jamais morre, mas se eterniza em seus atos heróicos.

Fonte de informações sobre o autor: http://pt.wikipedia.org/wiki/Miguel_de_Cervantes

1 Comentários:

Blogger Izaura Ferreira disse...

nossa li todos que saudade.

6 de março de 2021 às 07:00  

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